Tese – Pagamento por serviços ambientais: a produção de água como uma nova função da agricultura familiar na mata atlântica do Sudeste brasileiro

Rafael Eduardo Chiodi
(Doutor em Ecologia Aplicada)

Ler a tese na íntegra aqui.

Resumo

O rural está deixando de ser percebido apenas como espaço de produção agrícola para ser encarado como detentor de múltiplas funções de interesse geral da sociedade. O reconhecimento de funções sociais, ambientais e culturais da agricultura faz com que a população rural esteja no foco de novas políticas públicas de desenvolvimento. O enfoque da multifuncionalidade da agricultura busca construir um aparato teórico-metodológico para compreender essas funções e dar subsídio à formulação e avaliação dessas políticas. Dentre estas políticas, a de Pagamento por Serviços Ambientais para a Conservação dos Recursos Hídricos (PSA-Água) se destaca por reconhecer a proteção dos recursos hídricos como inerente ao rural. Neste sentido, o trabalho analisou como os projetos de pagamento por serviços ambientais destinados à conservação dos recursos hídricos estão influenciando dimensões da reprodução, manutenção e valorização das condições sociais, econômicas e ambientais da agricultura familiar nos diferentes contextos onde estão implementados na porção Mata Atlântica dos estados da região sudeste brasileira. Além de entender casos específicos, buscou-se estabelecer uma compreensão mais ampla do mecanismo de PSA como política pública para a agricultura familiar no Brasil. Usou-se o método de estudo de caso, pesquisando os projetos: Conservador das Águas em Extrema-MG, ProdutorES de Água em Alfredo Chaves-ES e o Projeto Piloto no PCJ em Joanópolis e Nazaré Paulista-SP. Desenvolveu-se quatro níveis de análise: 1) teórico, por meio de uma pesquisa bibliográfica; 2) institucional-legal, por meio de uma análise de conteúdo dos documentos legais que criam os projetos; 3) dos atores institucionais, por meio de entrevistas gravadas com os formuladores, gestores e executores dos projetos; e, 4) dos proprietários rurais, por meio de entrevistas semiestruturadas junto aos participantes e não participantes dos projetos. Identificou-se que, no campo teórico, as noções de multifuncionalidade da agricultura e de serviços ambientais se inter-relacionam, mas emergem sob referências distintas, o que torna instigante a mobilização da primeira para o exame dos projetos de PSA-Água no que se refere à sua capacidade de reconhecer e valorizar as múltiplas funções da agricultura familiar. As dimensões privilegiadas destes PSA-Água são: o direito de propriedade, a racionalidade econômica, o conhecimento técnico-científico e a conservação ambiental. Estas dimensões constituem eixos em torno dos quais os atores institucionais trabalharam para a existência dos projetos, o que relegou para segundo plano a perspectiva de construir uma política agroambiental com base na agricultura familiar. Estes atores atuaram menos para aumentar ou melhorar as condições dos serviços ambientais e mais para reforçar as instituições nas quais estão engajados. A implementação dos projetos ocorreu em contextos onde há perfis socioeconômicos heterogêneos de proprietários rurais. As tomadas de decisões ocorreram no entanto pouco levando em conta as dinâmicas sociais, econômicas e culturais em torno dos agricultores familiares. Assim, poucos impactos significativamente positivos sobre estas dimensões podem ser observados. Seja como for, foram os agricultores familiares os que mais contribuíram com o cumprimento das metas ambientais dos projetos. Concluiu-se que os projetos de PSA-Água analisados enquanto dispositivo de políticas públicas pouco valorizam o conjunto de funções da agricultura familiar no Brasil.

Palavras-chave: Agricultura familiar, Multifuncionalidade da agricultura, Políticas públicas, Produção de água, Serviços ambientais