Tese – Manejo de variedades de mandioca em áreas de reforma agrária: manutenção ou perda de agrobiodiversidade?

Fábio Frattini Marchetti
(Doutor em Ecologia Aplicada)

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Resumo

O potencial da agrobiodiversidade em fortalecer a segurança e soberania alimentar de comunidades rurais, com sustentabilidade ambiental e inclusão social, está amplamente reconhecido. Contudo, parte dessa diversidade biocultural tem sido perdida com a expansão da urbanização, da agricultura moderna e suas variedades comerciais, geneticamente homogêneas. Os assentamentos rurais de reforma agrária representam espaços de resistência, importantes para manter as pessoas no campo e estimular os processos que geram e mantém agrobiodiversidade. O objetivo da tese foi analisar como os contextos socioeconômicos e culturais, em diferentes regiões de reforma agrária, impactam o manejo e a manutenção da agrobiodiversidade associada à mandioca (Manihot esculenta), e contribuir para o aprimoramento de ações direcionadas ao seu uso e conservação. A tese está dividida em sete capítulos. O Capítulo 1 – Introdução geral – apresenta as origens e os manejos da agrobiodiversidade e suas estratégias de conservação, em nível global, a importância da mandioca nos estudos em agrobiodiversidade no Brasil, e as abordagens metodológicas em torno do tema. O Capítulo 2 – A não reforma agrária brasileira e seus impactos na conservação da agrobiodiversidade – traz um histórico das políticas públicas de reforma agrária no Brasil, e discute as possibilidades de aliar a organização social no campo, o desenvolvimento de assentamentos rurais e os programas de manejo e manutenção da agrobiodiversidade. O Capítulo 3 – O contexto socioeconômico dos assentados no Extremo Sul da Bahia e no Pontal do Paranapanema – apresenta as duas regiões selecionadas para esse estudo e faz apontamentos sobre os contextos socioeconômicos dos assentamentos rurais e dos agricultores amostrados em cada região. O Capítulo 4 – A estrutura da diversidade de variedades de mandioca nos assentamentos rurais – analisa, por meio de uma abordagem etnobotânica e genética, a estrutura e amplitude da diversidade de variedades de mandioca amostrada nos dois diferentes contextos regionais. O Capítulo 5 – Os conhecimentos locais e as práticas agrícolas associadas à diversidade de mandioca – analisa os elementos socioeconômicos e culturais que influenciam sobre a diversidade de mandioca amostrada, considerando os parâmetros de identidade, manejo agrícola e formas de uso das variedades locais. O Capítulo 6 – Ações de valorização e conservação da agrobiodiversidade: aprendizados dos Parques Naturais Regionais na França- apresenta ações de valorização e conservação da agrobiodiversidade a partir da experiência vivenciada pelo autor nos Parques Naturais Regionais, na França. E, por fim, o Capítulo 7 – Considerações Finais – revisita as questões iniciais da tese, analisa os resultados e conclusões apresentados e sugere ações para a valorização e conservação da agrobiodiversidade em assentamentos rurais de reforma agrária, em especial no Extremo Sul da Bahia e no Pontal do Paranapanema.

Palavras-chave: Agroecologia; Assentamentos rurais; Conservação on farm; Etnobotânica; Genética

Dissertação – Organizações de Controle Social na Região Metropolitana de São Paulo: relações de proximidade e de confiança em foco

Vitória Oliveira Pereira de Souza Leão
(Mestra em Ecologia Aplicada)

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Resumo

A produção orgânica, no Brasil, foi instituída legalmente no ano de 2003, com a Lei n° 10.831. A partir de então, foram estabelecidas normativas com a finalidade de regulamentar tal prática, bem como as formas de averiguação da qualidade no que se refere notadamente à comercialização destes produtos. Esta regulamentação configura o sistema brasileiro de avaliação de conformidade (SisOrg), uma resposta ao crescimento do mercado de alimentos orgânicos, cujas fronteiras internacionais avançam no Brasil. Neste sistema, são previstos três tipos de avaliação da conformidade orgânica: as certificações por auditoria privada, as certificações por organismo participativo e as Organizações de Controle Social (OCS). De forma sucinta, estas últimas permitem o reconhecimento da qualidade orgânica por meio da relação de confiança estabelecida entre os produtores e os consumidores sem intermediadores na comercialização de alimentos. Assim, as OCS preveem que os agricultores se organizem em processos de averiguação interna do cumprimento das normas da agricultura orgânica, o que lhes permite acessar circuitos curtos de proximidade, tendo reconhecimento oficial de qualidade orgânica. Além das feiras de produtores, os circuitos curtos de proximidade (CCP) compreendem os grupos de consumo responsável, programas públicos de abastecimento alimentar, entre outros. Nossa pesquisa procurou explorar as formas de organização dos agricultores na construção da qualidade orgânica, assim como as relações que são estabelecidas entre estes últimos e os consumidores nos mercados locais. A pesquisa mapeou, por meio do Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA) as OCS existentes na Região Metropolitana de São Paulo, selecionando cinco grupos. Esta primeira coleta de dados previu entrevistas semiestruturadas com 19 camponeses e a participação nas reuniões e em visitas de averiguação das OCS. Posteriormente, foram aplicados 38 questionários junto a consumidores de quatro circuitos curtos de proximidade diretamente associados às OCS em questão. A análise subsequente teve caráter qualitativo e visou ressaltar a riqueza das singularidades, além das homogeneidades encontradas na complexa interface que abrange política pública, camponeses, consumidores e mercado de alimentos. Neste quadro, lançou-se mão de abordagens teóricas que poderiam fornecer elementos pertinentes para discutir as relações de mercado e de trabalho que circunscrevem a vivência camponesa na modernidade. Para além da perspectiva de um dispositivo de política pública inovador, as OCS revelaram ser um mecanismo que, por um lado, coloca em questão a mercantilização das prerrogativas de qualidade e confiança e, por outro, revaloriza a sutil e subjetiva teia social que desempenha, também o seu papel nas relações de troca.

Palavras-chave: Agricultura camponesa; Circuitos curtos de proximidade; Produção orgânica; Relações de confiança; Sistema Brasileiro de Avaliação de Conformidade

Dissertação – Agricultura familiar e promoção da saúde: um novo olhar para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)

Natália Gebrim Doria
(Mestra em Ecologia Aplicada)

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Resumo

O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é uma importante ferramenta de política pública brasileira de combate à fome, de alcance da segurança alimentar e nutricional, de garantia do direito humano à alimentação adequada e de promoção do desenvolvimento rural. A partir da Lei no 11.947/ 2009, o PNAE passou a estar associado à abertura de mercado para os produtos da agricultura familiar. Esta lei determina que no mínimo 30% (trinta por cento) do total de recursos financeiros repassados pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) aos estados e municípios deverão ser utilizados na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar, com a dispensa do processo licitatório. Deste encontro, da alimentação escolar com a agricultura familiar, emerge uma ótica favorável ao reconhecimento de que o agricultor familiar pode assumir responsabilidades sociais, ambientais e culturais, muito além da responsabilidade produtiva em torno da oferta de produtos alimentícios às escolas. A partir desta perspectiva, nossa hipótese admite que o agricultor familiar reconhece, em particular em razão de sua participação no PNAE, sua atuação enquanto agente social promotor de saúde. O objetivo da pesquisa foi analisar agriculturas familiares que abastecem escolas graças ao PNAE de modo a verificar em que medida se trata de uma atividade promotora de saúde, a partir da perspectiva de agricultores/as de duas cooperativas. O desenvolvimento da pesquisa se fundou em metodologia qualitativa em saúde. As duas cooperativas de agricultura familiar focalizadas foram, a Cooperacra, localizada no município de Americana/SP e a Coopamsp, localizada no município de São Pedro/SP. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas com membros de suas diretorias e com agricultoras e agricultores cooperados. No total foram realizadas dezoito entrevistas, que foram gravadas, transcritas na integra e analisadas com base na metodologia de análise de conteúdo, sob o olhar dos referenciais da multifuncionalidade da agricultura e da promoção da saúde. A pesquisa evidenciou a importância do PNAE para a estruturação e fortalecimento das duas cooperativas, bem como para a reprodução socioeconômica das famílias cooperadas. O papel de promotores de saúde desempenhado pelos agricultores esteve especialmente vinculado à oferta de alimentos saudáveis aos escolares. Por alimentos saudáveis são compreendidos aqueles produzidos sem ou com o mínimo possível de agrotóxicos, frescos e produzidos localmente. Os agricultores também reconheceram o papel que desempenham na promoção da segurança alimentar e nutricional dos escolares e da sociedade de forma geral. Ademais, uma relação harmoniosa com a natureza e o cuidado com o meio ambiente também estiveram vinculados a maneiras de promover saúde, sendo identificados como funções sociais desempenhadas pelos agricultores. Concluímos que, para que o agricultor possa ser reconhecido enquanto agente promotor de saúde, é preciso primeiramente fortalecê-lo em sua atuação no meio rural. O reconhecimento político pelo PNAE favorece então uma atuação multifuncional de agricultores familiares. Portanto, o investimento em programas e políticas públicas voltadas às questões como a reforma agrária, o acesso ao crédito rural, a comercialização dos produtos agrícolas oriundos da agricultura familiar e a produção de alimentos ambiental, social e economicamente mais sustentáveis (como no caso da perspectiva agroecológica) constituem meios de melhorar a saúde da população brasileira.

Palavras-chave: Agricultura familiar, Alimentação escolar, Determinantes sociais de saúde, Multifuncionalidade da agricultura, Promoção da saúde

Dissertação – A implantação da Indicação Geográfica do queijo da Canastra sob as luzes da multifuncionalidade da agricultura: a vaca dos queijos de ouro

Pierre Crouzoulon
(Mestre em Ecologia Aplicada)

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Resumo

Esta dissertação veicula uma análise sobre a organização coletiva em torno da Indicação Geográfica (IG) do Queijo Minas Artesanal da Canastra (MG, Brasil), sua importância, seus limites e desafios. Abordamos o tema em estudo a partir do referencial da multifuncionalidade da agricultura. Com base em diferentes dimensões, este quadro analítico proporciona um olhar sistêmico sobre a cadeia do queijo, seus atores e as estratégias de desenvolvimento territorial. Nesta perspectiva, o estudo pretende examinar tanto a organização social dos protagonistas da IG quanto seus efeitos na gestão dos estabelecimentos agropecuários, na preservação e valorização da cultura local, na segurança do alimento e no meio-ambiente. A abordagem de estudo focalizou o núcleo organizado em torno da IG em relação aos outros atores presentes no território, que não participam desse movimento. Além da documentação (sobretudo legislativa e associativa), a realização de entrevistas com os principais atores da cadeia e a observação participante da associação e dos produtores foram as principais ferramentas de obtenção de dados. Foi discutida a origem do projeto que conduziu ao registro da IG em 2012 pela APROCAN (Associação dos Produtores do Queijo Canastra) à luz da legislação sanitária referente à produção de queijo artesanal de leite cru no Brasil. O Regulamento de Uso do dispositivo IG da Canastra buscou consenso entre segurança do alimento e preservação da tradição e do saber fazer local. Com efeito, a adequação à legislação sanitária vigente constitui um pré-requisito excludente à grande maioria dos pequenos produtores para ingresso na associação responsável da IG. O contexto nacional e regional favoreceu o fortalecimento da APROCAN, que impulsionou rápidas transformações no território em termos de segurança do produto, desenvolvimento de uma identidade sociocultural e valorização econômica do queijo. Em particular, ferramentas e técnicas inovadoras foram incorporadas em diversos graus pelo artesão queijeiro que se reinventa e se valoriza. Assim, a APROCAN é levada a considerar as hibridações do queijo, de maneira a delimitar de forma precisa normas de produção comuns da IG. Esse processo revela novas funções para a organização coletiva. De fato, a valorização econômica do produto num mercado de nicho é limitada a determinado perfil de produtores capazes de arcar com os custos de adequação à legislação. Assim, a inclusão social pelo dispositivo e sua aceitação local enfrentam muitas dificuldades. A multiplicação das barreiras de entrada delimita certo “padrão da associação”, reforçado pela fragilidade da cultura associativista e à falta de estratégias de inclusão dos produtores de todo o território. Existe uma reciprocidade de valorização do queijo e do território da Canastra, inclusive do seu terroir que é amplamente associado à tipicidade do produto. Entretanto, a identidade cultural e a preservação do ambiente estão questionadas por certas perspectivas de modernização, que mescla o tradicional com progresso e inovação. Portanto, mesmo demonstrando perspectivas promissoras, a organização coletiva da IG ainda não alcança um desenvolvimento territorial que considere as múltiplas funções da agricultura.

Palavras-chave: Desenvolvimento territorial, Indicação de Procedência, Organização coletiva, Queijo Minas Artesanal

Tese – Práticas agroalimentares em unidades de conservação de uso sustentável sob a ótica da segurança alimentar

Katia Maria Pacheco dos Santos
(Doutora em Ecologia Aplicada)

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Resumo

Mudanças em modos de vida têm sido observadas junto aos agricultores quilombolas e não quilombolas no Vale do Ribeira, trazendo reflexos diretos à alimentação das famílias, bem como ao modo de uso da terra para fins alimentares. A agricultura em pequena escala é uma prática comum nas unidades de conservação no bioma Mata Atlântica, configurando diferentes realidades quanto à segurança alimentar das populações residentes nessas áreas de conservação ambiental. Nesta pesquisa objetivou-se explorar a relação entre modos de vida e segurança alimentar em duas comunidades agrícolas em duas unidades de conservação de uso sustentável, a Reserva de Desenvolvimento Sustentável Quilombos da Barra do Turvo e da Área de Proteção Ambiental Planalto do Turvo, que fazem parte do Mosaico de Unidades de Conservação do Jacupiranga, Vale do Ribeira, SP. Os métodos usados para a coleta de dados incluíram questionário estruturado, recordatório 24 horas, sendo visitadas 48 unidades familiares, 24 em cada unidade de conservação. Dados secundários referentes ao cadastramento oficial do ITESP e da gestão de ambas UCs também foram consultados e sistematizados. Foram identificadas as atividades de subsistência que geram recursos alimentares e financeiros, os ambientes de obtenção das mesmas; os hábitos alimentares e verificados contrastes quanto ao consumo de alimentos. Atividades geradoras de alimentos contribuem para a segurança alimentar especialmente na RDS Quilombos, comunidade com maior grau de envolvimento com as práticas agroalimentares quando comparada a APA Planalto do Turvo. Diferenças significativas quanto à composição da dieta entre os grupos pesquisados não foram constatadas nesta pesquisa, indicando que não existem períodos de insegurança alimentar. Os resultados deste estudo reforçam a importância da agricultura contribuindo para a segurança alimentar, concluindo que a prática de produção agroalimentar na RDS e na APA não contradiz a premissa dessas unidades de conservação e contribui para a manutenção da segurança e a soberania alimentar. Embora esse equilíbrio seja frágil, podendo se desestabilizar devido a fatores como diminuição da mão de obra e baixa produtividade, pode-se considerar que a segurança e soberania alimentar foram confirmadas, uma vez que observou-se não haver insegurança alimentar junto aos grupos investigados.

Palavras-chave: Agricultores migrantes, Agricultores quilombolas, Área de Proteção Ambiental, Hábitos alimentares, Mata atlântica, Reserva de Desenvolvimento sustentável